Os Adornos no Japão da Antiguidade ao Presente
Embora o ato de enfeitar os corpos com belos adereços não seja algo essencial à sobrevivência, as pessoas têm utilizado adornos desde os tempos mais antigos. Talvez possamos considerar tal ato como um desejo natural do ser humano.
As Joias são Adornos Utilizados para Realçar a Beleza
Em japonês, a palavra “joia” significa, literalmente, “tesouro” ou “enfeitar”. Seu desenvolvimento tem uma relação muito próxima com a história do local em que foram produzidas e se transformaram com o passar do tempo. Tentaremos desvendar a história das joias japonesas para podermos refletir sobre o futuro desses adereços.
1. Japão Antigo: a História das Joias
Na mitologia e história do Japão, nos vêm à mente personalidades com um brilho próprio, o que nos remete à frase “Na origem, a mulher era literalmente o sol”. Essas palavras são de autoria de Raichō Hiratsuka, ativista feminina que propôs um novo modo de vida às mulheres:
- Amaterasu Ōmikami
Dizem que Amaterasu Ōmikami, a deusa do sol na mitologia japonesa, nasceu quando o deus criador do arquipélago japonês lavou seu olho esquerdo, sendo presenteada com um colar.
Entre as relíquias do período Jōmon, cerca de dezesseis mil anos atrás, foi descoberto um adorno em jade, que era valorizado e conhecido como “o rei das pedras preciosas”, gerando a interpretação de que o colar de Amaterasu fora um colar de jade.
- Himiko
Himiko era a governante do Yamatai-koku, um reino que existia no Japão nos séculos II ao III. Nesse período, braceletes de bronze e ferro e colares de vidro passaram a ser usados no arquipélago pelos líderes de vilas como símbolo de poder.
- Nukada no Ōkimi
Nukada no Ōkimi foi a princesa consorte do 40º imperador no Período Asuka (592-710). Muitas vezes descrita por sua beleza inigualável e que serviu como fonte de inspiração para vários artistas ao longo do tempo. Um exemplo é a obra “Asuka no haru no Nukada no Ōkimi” (“Nukada no Ōkimi em um dia de primavera em Asuka”) do aclamado artista japonês Yukihiko Yasuda, que foi extensamente reproduzida até em bilhetes de trem.
Nessa pintura, Nukada no Ōkimi tem um lenço comprido azul-esverdeado em seus ombros e usa um colar fino e um enfeite de cabelo, trajes elegantes e dignos de uma imperatriz.
2. Desenvolvimento das joias no Japão
O armazém do templo Tōdaiji, o Shōsōin, foi repositório de muitos tesouros antigos. Um exemplo desses artefatos é uma faixa para quimono decorada com lápis-lazúli e sua caixa ornamentada, que chegaram ao Japão por meio da Rota da Seda. As joias japonesas da época foram desenvolvidas a partir da influência de peças que vinham do continente.
Posteriormente, no Período Heian (794-1185), uma cultura tipicamente japonesa floresceu e os adornos tiveram outros desenvolvimentos. Um item que ganhou destaque especial nesse período foi o leque, que não servia somente para ventilar, mas também como um acessório elegante decorado com cenas cotidianas.
No Período Kamakura (1185-1333), em que o poder político foi transferido da nobreza para a classe guerreira samurais, a preferência passou para peças menos chamativas. No Período Azuchi-Momoyama (1569-1603), em que os guerreiros também tinham grande destaque, iniciou-se o comércio com os países da Europa. Anéis, broches, pingentes e outras peças foram introduzidos no Japão por comerciantes a partir do Oriente Médio e se espalharam gradativamente pelo arquipélago.
3. Os adereços femininos do Período Edo
Durante o Período Edo (1603-1867), o comércio com o exterior foi limitado pelo governo feudal e uma cultura de joias própria do Japão teve um grande florescimento. Foi nesse período que se desenvolveu o conceito estético de “iki”, daquilo que é refinado e glamouroso. Os habitantes de Edo, a capital da época, buscavam o “iki” em vários objetos, como roupas e acessórios.
Quando se estabeleceu o costume das mulheres prenderem os cabelos em penteados mais altos, viu-se a expansão do uso dos enfeites de cabelo. Dentre esses adornos temos o kushi, que servia de pente e de enfeite, e o kanzashi, que trazia elegância ao penteado.
Kushi:
No Período Edo também eram utilizados materiais luxuosos como o bekkō, um produto feito a partir do casco da tartaruga-de-pente. Na obra “Migaeri bijin-zu” (Bela Mulher Olhando para Trás), de Moronobu Hishikawa, temos o retrato de uma mulher com um estilo inédito de penteado e roupas da moda da época, utilizando também um kushi.
Com a subida repentina do valor comercial do bekkō, tornou-se comum o kushi de madeira com maki-e, técnica em que se aplica pó de ouro sobre a pintura de laca
Kanzashi:
Já o kanzashi é um adorno de cabelo em formato fino e comprido que se espeta no penteado. Eram manufaturados diversos tipos de belíssimos kanzashi, como os que tinham enfeites pendurados, os esculpidos em prata e os que dispunham de algum tipo de mecanismo.
Havia mulheres que usavam mais de um kanzashi no mesmo penteado. Em Edo, as mulheres estavam submetidas a certas regras de vestuário. Então, os adornos de cabelo funcionavam como joias, que muitas podiam ser usadas de forma divertida.
4. Adereços para os homens
No Período Edo, os homens mostravam cuidado com o vestuário e adereços e vestiam-se com originalidade. O inrō, o porta-tabaco, e o tōsōgu eram como joias - que materializavam o iki das técnicas dos artesãos e criadores.
Inrō:
Originalmente, o inrō era um porta-remédios portátil, mas, no Período Edo, tornou-se um acessório que indicava a preocupação estética do guerreiro que o carregava. Artesãos de maki-e ou hori-e (gravuras) utilizavam materiais como madeira, chifres de animais e metais para produzir belíssimas peças.
Porta-tabaco:
O porta-tabaco, que servia para guardar e carregar o tabaco e o cachimbo tipo kiseru, tinha versões masculina e feminina. Os porta-tabacos dos homens, em especial na segunda metade do Período Edo, eram feitos de materiais raros e diversos tinham designs muito elaborados.
Tōsōgu (acessórios da espada):
Quando estavam com seu traje formal completo, os samurais carregavam o inrō pendurado na lombar do lado direito e uma espada grande ou pequena no lado esquerdo. O Período Edo foi uma época de poucos conflitos militares e a espada, que era uma arma, teve suas características estéticas ainda mais enfatizadas, passando também a ter a função de acessório.
Os designs únicos e refinados e os diversos adornos práticos criados no Período Edo continuam vivos no senso estético do Japão contemporâneo.
5. O Japão Moderno e as Joias
No Período Meiji (1868-1912), o Japão recebeu influências de vários países e, com as mudanças de vestuário e penteado, as joias também mostraram grandes transformações. No Período Taishō (1912-1926), adquiriu-se o costume de trocar anéis de casamento e noivado - deixando o universo das joias com ainda mais importância. Nos tempos atuais, as pessoas usam joias em situações ainda mais diversas.
Uma Era em que Todos Podem Usar Adereços de Forma Mais Livre
No Período Edo, homens e mulheres se divertiam experimentando vários tipos de adereços e vestimentas da moda. Essa tendência foi herdada nos tempos atuais e agora vemos o surgimento de joias sem gênero. Temos colares que enfatizam a beleza do movimento e braceletes robustos que dão força aqueles que os usam. Hoje, cada indivíduo pode escolher qual adereço deseja usar.
6. Joias que Marcam Momentos
As joias também têm a função de simbolizar momentos decisivos e carregá-los ao longo do tempo: trocam-se alianças de noivado ou casamento e dão-se anéis de presente quando os jovens atingem a maioridade.
O anel de diamante representa uma relação amorosa e o colar de pérolas simboliza a inclusão no mundo dos adultos. Ambos remetem à pessoa que presenteou ou a emoção da primeira vez que a peça foi utilizada.
Algumas joias também são herdadas de pais para filhos. Essas guardam lembranças queridas de um ente que a transmitiu e são tesouros insubstituíveis.
7. O Senso Estético Herdado do Passado
A primeira pessoa no mundo a produzir uma pérola cultivada foi Kōkichi Mikimoto, conhecido como o “rei das pérolas”. Em 1893, ele obteve sucesso na produção de uma pérola semiesférica e expandiu o cultivo de pérolas pelo país, possibilitando a difusão das joias feitas com esse elemento.
Ainda hoje, encontramos joias em que são empregadas técnicas tradicionais japonesas como o maki-e e a gravura em metal.
Os tempos e as demandas se transformam, mas os artesãos tradicionais que marcaram a história com suas técnicas de excelência nunca serão esquecidos.
Referências Bibliográficas:
Hiratsuka Raichō hyōronshū, Iwanami shoten.
Kojiki, Iwanami shoten.
Nihon shoki, Iwanami shoten.
Gishi Wajinden. Gokansho Waden. Sosho Wakokuden.
Zuisho Wakokuden, Iwanami shoten.
Juerii no sekaishi, Shinchō bunko.
Nihon sōshingushi, Bijutsu shuppan-sha. Nihon no bijutsu keshō dōgu, Shibundō.
Hana hiraku kōshitsu bunka, Seigensha.
ART in LIFE, LIFE and Beauty, Museu de Arte Suntory.
Ukiyo-e bijin kurabe, POLA Research Institute.
Kimono to sōshingu ni miru Edo no ii onna, ii otoko, Museu do Tabaco e do Sal.
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Ímpares